domingo, 7 de outubro de 2012

Submundo


No escuro é quando notamos que o tempo não existe. Na escuridão os minutos podem facilmente ser horas, dias, anos. A vida é estruturada em referenciais e já estou há tanto tempo preso aqui dentro que já nem mais abro meus olhos, os mesmos que agora repousam atrofiados por sobre a minha pele (antes) branca. Mas na escuridão não existem cores, nem emoções, nem espaço para o medo.  Sei que meu estômago se acostumou com a escassez e quimiosintetiza a partir da escuridão algum nutriente que as vezes parece ser minha própria pele, minha carne, meu sangue. O desespero inicial já se calou, talvez evaporando das primeiras vezes que utilizei minhas mãos e garras para capturar aquelas criaturinhas peludas que circulam corriqueiramente no submundo em que me encontro. Custa-me lembrar de minha cara peluda, meus olhos negros, de minha figura. Tampouco tenho sucesso ao tentar recordar como vim parar aqui ou o motivo. Minhas articulações doem e a dor é resultado da falta de espaço. Esgueiro-me por estes finos corredores de concreto (parecem de concreto) sem saber ao certo para onde vou. Exercito minha mente na tentativa de manter-me lúcido, mas quase tudo parece ser em vão. Do passado, talvez lembre apenas das correntes que prendiam meus pulsos.  Quem sou permanece como o maior enigma imposto ao meu limitado, porém real mundo.  As ambições humanas do pêndulo de Schoppenhauer  são tão ilusórias e abstratas como minha própria noção de mundo. Meu corpo se adaptou para hidratar-se apenas do desejo de liberdade. Imaginem-se durante significativo tempo apenas sentindo uma textura, apenas ouvindo seus próprios sons e imobilizados pela matéria circundante que impede o estiramento dos braços. O fio da vida era no início fibra de metal e agora não passa de um tecido fino e esfarrapado, prestes a se romper com um sopro. A espera pela morte nunca foi tão tentadora, mas o esgotamento metabólico aceleraria tudo. Pelo menos isso eu achava. Que tipo de animal me tornei?  Espere. Senti algo. De. Metal. Algo de metal. Que aroma mais poderoso de ferro. A eletricidade paira no ar. Estico minhas articulações que agora tem espaço. Cambaleante e reaprendendo a andar. Resta-me rir. Avisto uma luz, e como é bela. Meus ouvidos vibram com sons estimulantes! Subo no que me parece a plataforma de uma estação de trem. A confusão é geral. Olhos me encaram, gritos se me dirigem, as pessoas estão correndo. E estão correndo para longe de mim. Não entendo. Passo em frente aos vidros de uma janela e pude me lembrar como havia chegado até onde estava. Tinha me esquecido que estava preso naquele corpo. E que a claustrofobia era inevitável.

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