sexta-feira, 28 de dezembro de 2012

Uma pitada de erotismo

Se abrissem seu vestido pulariam do tecido, enormes, circulares, enormes e infalíveis:  dores que residem em seu coração.

Sonhei com você esta noite

Sonhei com você essa noite... Sonhei que te escrevia um bilhete sobre um sonho que tive há alguns dias atrás. E é esse bilhete que escrevo agora aqui, expondo meu coração em palavras, que doem, mas têm contorno sincero. No meu sonho eu te abraçava. Era um abraço puro, quase virgem, o qual não tinha tempo: não era curto nem longo. Com o abraço eram ditas as coisas que guardei/guardo comigo por que não tive coragem de te dizer. E eu não precisava mover a boca, nem os braços, nem pensar em nada. Eu sabia que você já tinha entendido tudo, por que com a gente sempre funcionou assim. Eu não dizia que errei, pois não me sinto assim. E você não exigia que eu me sentisse, me embalava numa aceitação que beirava o inimaginável. No silêncio subtendiam-se as raivas, as tristezas e dores que carrego hoje no peito, que sem jeito arde nas chamas do passado. O momento era aquele e mais nenhum, era a hora de chorar as saudades e de sonhar com uma coisa que não mais existia. Mas que podia voltar a existir ali. E a questão era justamente a dúvida se valeria a pena recomeçar. Recomeços doem, exigem e muitas vezes nos alimentam com comida envenenada. Eu enterrava meu rosto nos pensamentos e ao mesmo tempo nada pensava. O abraço virava quase um mergulho rumo ao vazio, que sem dó atropelava a esperança jogando a felicidade pelo ralo. Aos ouvidos não chegavam ruídos além do silêncio mútuo que atentamente escutávamos. De olhos fechados e corações abertos, enxergávamos tudo o que nos permeava. Nada era mais belo que aquele momento. E ao mesmo tempo, nada era tão horripilante quanto. Não existia vontade de separação, pois como uma passagem para o mundo real, seríamos obrigadas a enfrentar a verdade que com tanto pesar rodopiava pelas nossas vidas. E então, duas lágrimas escapavam dos meus olhos. Nos separávamos.

— Já entendi - você dizia.

E aí eu acordei.

quinta-feira, 20 de dezembro de 2012

La línea entre el pasado y...

Cuando se hace de noche
Escucho tu voz
en los sueños que vuelan
por las calles de un cielo
brillantemente oscuro
e interno como las vísceras de un amor
pasado, pero que se repite.

Las nubes son tus manos
que me tocan el cuerpo
y el alma
transpareciendo, apareciendo y siendo
la única y plena verdad.

Son vagas las palabras que suenan por el alba,
por los rincones de mi mente,
del corazón que pulsa solo e incoloro,
pidiendo, clamando, siendo punzante y
soledad y amor:
a vos.


O passado que se carrega sozinho

O relógio de ouro que o coelho carrega
Tiquetaquea à minha frente
desdobrando o caminho
que sinuoso me consome
nas labaredas do meu próprio passado.

Sugestivamente segue-me um velho,
sem nome, idade, tempo
limpo, quieto, irreal
Que sufoca-me os pulmões ácidos
Consumidos pela sombra dos meus atos
(que me predam sem piedade).

Os olhos confusos escapam no contorcer do coração,
onde o velho está
e deixa de estar e está de novo.
Átras, o velho.
Ao lado, idem
À frente, idem
Idem
Idem
Idem.

E quando ele me sorri,
triste verdade:
não possui nenhum dente.




domingo, 25 de novembro de 2012

Hey, Sir, Let me Tell You


I will call you an angel,
For there isn’t better word
To describe your scent, your smell
Even your soul.
The soul that kisses me
End rests on my mind
Making clocks spin backwards
Making my heart so blind.

I can try to say an only truth
But unfortunately my words
Are with you.
I offer my brain, my soul, my fate
To stay by you’re side,
In your heart
No matter when.

segunda-feira, 19 de novembro de 2012

No Ônibus do Metrô

Seus lábios úmidos me reconfortavam a cada vez que se apoiavam sobre a pele quente do meu pescoço. Na chuva os nossos sentimentos pulam do coração e enredam-se em nós nas gotas que despencam serenamente, friamente, poeticamente. E no meio daquele ônibus, meus olhos embaçavam aos poucos até  permanecer na minha íris apenas a beleza de seu rosto. Sentia a confiança e uma alegria jamais experimentada. Ali, naquele momento, éramos eu e você. E nada mais importava. Não importavam mais as brigas, os conflitos, a falta de identificação com algumas pessoas que amava. Naquele momento o único cheiro que chegava às minhas narinas era o da verdade que aflorava do meu peito. Nunca tinha usado palavras tão sinceras. Nunca amei alguém tão sinceramente como eu te amo. Naquele momento eu senti algo inexplicável, como se todo o passado fosse aquilo e como se todo o futuro congelasse ali. Sua mão acariciava a minha e sentamos no silêncio que nos abraçava e nos cobria. Nos amávamos mais que tudo. Em movimento tudo parecia em câmera lenta, tudo estava desenquadrado pois congelava nos seus olhos que me fitavam e me faziam sentir a mulher mais sortuda do mundo. Na chuva, meus pés se molhavam, minhas mãos procuravam as tuas. Segredos. Segredos que pulavam da sua boca numa dança que representava quase numa metáfora o nosso amor, e respeito, e carinho. Segredos que agora não eram seus apenas, eram nossos. Assim como meu amor... Assim como aquele momento.

sexta-feira, 16 de novembro de 2012

Por Que Todo Mundo Dasabafa

As coisas na vida têm a dimensão que lhe designamos e algumas fases são marcadas pela presença do que eu gosto de denominar "pequenos conflitos". Não se deixe enganar pelo o adjetivo utilizado normalmente para designar a característica de "menor". Os pequenos conflitos são os piores. Como um coágulo de pequenas dimensões, um pequeno conflito, quando misturado a determinadas circunstâncias, pode fazer seu coração parar. Esses conflitos são os piores por que eles envolvem normalmente pessoas importantes, já que, se envolvessem pessoas odiadas, estes seriam conflitos enormes, complexos e assustadoramente ignoráveis. Um grande conflito ou a gente resolve com grandes gestos ou abraça a situação assimilando-a e acostumando-se a ela (claro que no caminho a gente sofre, e muito). Quando me deparo com um pequeno conflito não consigo deixar de vê-lo como uma imensa perda de tempo que nem ao menos permite o sentimento de grande culpa ou tristeza. Eles existem para irritar de forma sutil, sem ter coragem suficiente para jogar a verdade na nossa cara. E essa sutileza e essa máscara de boas aparências, escondem milhares de outras mágoas que ocupam nosso tempo inutilmente: os pequenos conflitos não têm solução. Com tantas coisas na vida o ser humano continua egocêntrico e, enquanto uns admitem o orgulho e egoísmo, outros tentam disfarçá-lo! O que é um pequeno probleminha na nossa rotina? No nosso círculo de amizades? É uma possibilidade para jogar com cada sensibilidade e cada "talão de Aquiles" que encontramos naquele em que depositamos o desconforto referente àquele pequeno conflito. O problema é esse, um pequeno conflito é apenas um reflexo equivocado e vacilante de uma grande auto-insatisfação. Então na boa, se está com algum probleminha comigo peço que você engula ou que venha admitir pra mim como ele realmente te incomoda. Chega de falsidade e de preocupações ridículas e fúteis, por favor. Tenho coisas muito mais importantes pra fazer.

quinta-feira, 8 de novembro de 2012

Ode às palavras

O que acontece com as palavras ditas? Elas mergulham no abismo do vácuo desde o trampolim da língua, encontrando no vazio, o cemitério das palavras. Estocadas ali, ficam à espreita de uma brecha para retornarem ao mundo nosso, pairando por entre os batons borrados dos amantes, por entre as lágrimas dos solitários ou por entre a fumaça dos fumantes. As palavras ditas encontram uma inércia incessantemente incomoda, pois paradas estão, e continuam paradas, e paradas continuam. Quando adentram nos ossículos do ouvido, elas falam entre elas e discutem quem chegará primeiro ou quem será perdida no caminho. As palavras têm vida própria e tem sinônimos, e a principal fobia é que caiam em desuso. As palavras são des tru            ídas com um sopro. As palavras ditas não precisam de metáforas, elas mesmas o são. Os vocábulos assassinam corações, aspirações, sonhos. Nada é mais poderoso do que uma palavra. E as palavras sabem disso, conhecem seu poder e psicopateiam os humanos indefesos. Escrever uma palavra é imortalizá-la, é aceitar sua real importância e atribuir-lhe o merecido valor. Uma palavra pode ser como um muro trincado e sem cimento e sem argamassa e sem espaço ou tempo. Uma palavra não tem tamanho específico, ela aumenta e diminui dependendo de onde é usada. As palavras não estão subordinadas à nada ou ninguém, elas são independentes e atrozes. Correm mais rápido que uma bala e mais devagar que uma lesma gosmenta. As palavras são o que nós somos. As palavras podem ser mentira, ou verdade. São como células do corpo, que absorvem nutrientes e os produzem. Por isso, faço uma ode à elas: agradeço e desagradeço. Mas continuo usando-as mais do que um bebê usa chupeta.

terça-feira, 16 de outubro de 2012

Máscaras Vazias

Tamanho sentimento que me atravessa
como o Sol à um vitral
esquentando minha pele
E pelos sulcos, os poros
Esvai-se o medo de que no fundo sejamos
Os mesmos,
Porém diferentes.

A lágrima seca percorre os sonhos
Que desembarcam no cais
Escuro da cidade e da multidão
Onde todos são e usam máscaras.
São vazias e estáticas
girando como um peão viciado e cego
rumo à si mesmo.
Desemoções, desentimentos, desespero.
Mas e os rostos?

Escondidos atrás do disfarce
estão a sede pela utopia e
pelas paredes reconfortantes dos meus neurônios.
A fuga parece tentadora
de mãos enredadas com a solidão pulsante do ser,
que agora não mais vive
além das fronteiras do sonho.

Pena que sonhar às vezes seja chato.

domingo, 7 de outubro de 2012

Submundo


No escuro é quando notamos que o tempo não existe. Na escuridão os minutos podem facilmente ser horas, dias, anos. A vida é estruturada em referenciais e já estou há tanto tempo preso aqui dentro que já nem mais abro meus olhos, os mesmos que agora repousam atrofiados por sobre a minha pele (antes) branca. Mas na escuridão não existem cores, nem emoções, nem espaço para o medo.  Sei que meu estômago se acostumou com a escassez e quimiosintetiza a partir da escuridão algum nutriente que as vezes parece ser minha própria pele, minha carne, meu sangue. O desespero inicial já se calou, talvez evaporando das primeiras vezes que utilizei minhas mãos e garras para capturar aquelas criaturinhas peludas que circulam corriqueiramente no submundo em que me encontro. Custa-me lembrar de minha cara peluda, meus olhos negros, de minha figura. Tampouco tenho sucesso ao tentar recordar como vim parar aqui ou o motivo. Minhas articulações doem e a dor é resultado da falta de espaço. Esgueiro-me por estes finos corredores de concreto (parecem de concreto) sem saber ao certo para onde vou. Exercito minha mente na tentativa de manter-me lúcido, mas quase tudo parece ser em vão. Do passado, talvez lembre apenas das correntes que prendiam meus pulsos.  Quem sou permanece como o maior enigma imposto ao meu limitado, porém real mundo.  As ambições humanas do pêndulo de Schoppenhauer  são tão ilusórias e abstratas como minha própria noção de mundo. Meu corpo se adaptou para hidratar-se apenas do desejo de liberdade. Imaginem-se durante significativo tempo apenas sentindo uma textura, apenas ouvindo seus próprios sons e imobilizados pela matéria circundante que impede o estiramento dos braços. O fio da vida era no início fibra de metal e agora não passa de um tecido fino e esfarrapado, prestes a se romper com um sopro. A espera pela morte nunca foi tão tentadora, mas o esgotamento metabólico aceleraria tudo. Pelo menos isso eu achava. Que tipo de animal me tornei?  Espere. Senti algo. De. Metal. Algo de metal. Que aroma mais poderoso de ferro. A eletricidade paira no ar. Estico minhas articulações que agora tem espaço. Cambaleante e reaprendendo a andar. Resta-me rir. Avisto uma luz, e como é bela. Meus ouvidos vibram com sons estimulantes! Subo no que me parece a plataforma de uma estação de trem. A confusão é geral. Olhos me encaram, gritos se me dirigem, as pessoas estão correndo. E estão correndo para longe de mim. Não entendo. Passo em frente aos vidros de uma janela e pude me lembrar como havia chegado até onde estava. Tinha me esquecido que estava preso naquele corpo. E que a claustrofobia era inevitável.

Ensaios sobre a Amargura e Felicidade da Alma 2 - "O Real me dá asma"

Os homens mudam e a sociedade impôs ao intelecto humano uma condição de quase constante auto-contemplação. Autóctones dessa esfera a que chamamos "Terra", o homem tem desafiado até as leis da natureza, a mesma que é o pilar (e não deixa de ser mais de um) de sustentação da vida. Nenhuma objeção quanto à desafiadora e complexa teoria da evolução darwniana das espécies, mas o homem desevolucionou quando se trata de variados aspectos que transcendem o aspecto físico. Os computadores, as fábricas, o capital e incontáveis coisas não são fatores demasiadamente convincentes para sustentar a ideal evolução, são apenas provas da capacidade do universo dos neurônios de criar e de adaptar. Perdemos os pêlos corporais (ou ao menos parte deles), andamos em posição ereta, desenvolvemos um polegar opositor. Esse mesmo ser, o rei dos reis da monárquica teia alimentar, criou uma sede insaciável movida pela curiosidade (para não dizer ganância). Cambaleantes numa corda bamba os homens procuram meios de driblar a inevitável e temida morte. O que se ganhou em velocidade de acesso à bens também ganhou-se em rapidez de auto-destruição. O planeta chora com a mesquinhez. As cidades são contruídas por sobre o sangue dos escravos (ou quase) que são acorrentados pela metafórica corrente do egoísmo humano. A banalização dos laços afetivos cresce numa curva quase reta, abolindo a humanidade que ainda paira no ar. Agora as guerras destroem mais, agora a tortura economica e psicológica reina ainda mais nos campos de batalha. As atrocidades enforcam meus pulmões que se contorcem com uma ferocidade temerosa. E é nesse momento que se vê alguém dando um sanduíche para um morador de rua. E é assim que me dou (falo em primeira pessoa para enfatizar meus sentimentos) o direito ou quase reconforto de um único pensamento: Para o futuro, nunca é tarde demais.

quinta-feira, 4 de outubro de 2012

Aforismo Esquizofrênico

O problema de se falar com as paredes é a possiblidade de um dia elas começarem a reponder.

Ensaios sobre a Amargura e Felicidade da Alma 1 - "Entediar-se é mascarar o tempo"

Em meio á um turbilhão (utilizando um eufemismo) de coisas, nasceu no interior de minhas vísceras uma idéia, e talvez nada seja realmente mais forte do que essa idéia. O mais difícil não é tê-la, mas sim cultivá-la e desenvolvê-la na esperança de que um dia ela passe a ser real e não apenas inteligível. Vou chamá-la de um ensaio pois estou ensaiando parte da minha realidade, estou exercitando meus pensamentos cada vez mais no intuito de algum dia aperfeiçoar a essência que está por trás deles. A amargura e a felicidade são os verdadeiros paradoxos e antítese que existem, e atraledos entre si, conduzem as emoções e são o bastão da alma cega, que está sempre a procura de um não sei o quê que talvez nem a filosofia seja capaz de propor. E a alma nada mais é do que nosso próprio mundo, do que uma metáfora reconfortante (ou não) para essa coisa que denominamos vida. O aleatório talvez seja uma das únicas coisas no ser humano que sobreviveu autêntica depois de muitos anos e regimes e paixões e teoremas. Por isso, abuso da aleatoriedade ao escrever estes textos, seja para construir ou desconstruir sonhos e idéias minhas ou para desafiar minha própria rotina com uma pitada de inesperado. Num mundo incessante, o momento de tédio é quase uma ilusão, uma utopia. E esta utopia é a que pretendo explorar no intuito de ver se o tédio é o exercício do nada ou o exercitar de algo. Sem márcaras, sem tempo e sem pretensões demasiadamente marcantes, embarco agora numa viagem só de ida rumo ao desconhecido. E a sensação jamais foi tão boa.

Os títulos...
Silogismos da Amargura
                       Emil Michel Cioran (1911-1995)

terça-feira, 18 de setembro de 2012

Um Adeus Não Tão Trágico

A cidade é a maior hipérbole do homem. E talvez fosse isso tudo o que pairava na cabeça dela enquanto caminhava por aquela vasta avenida. Avenida vazia assim como as esquinas da sua mente. Os semáforos acessos davam um ar de Natal, mar de verde, vermelho, amarelo... Era meio trágico. As luzes brilhavam tristes na pele pálida dos seus braços, como se não tivessem nenhum motivo para estarem ali. A fumaça do cigarro se misturava com os sentimentos que evaporavam através de seus olhos. O cheiro de cimento se apoderava das suas células que vibravam a cada passo naquele caminho vazio. Era noite, e na cidade noite pode ser sinônimo de silêncio. O silêncio abria espaço pros pensamentos e com eles vinham as vozes, as imagens, o vento. Num ritmo de multi-descoordenação o mundo ia ficando para trás... E estava tudo bem. Era ela subindo para aquele lugar onde as estrelas jamais serão ofuscadas por nada. Era ela e a imaginação dela, apenas. Aos pouco o ar concentrou-se no contorno de seu corpo, afinal só existia ela e mais nada. Mochila nas costas que já não pesava, sapatos que já não encostavam no chão. Ela fez sinal, o ônibus parou. Agora ninguém ia conseguir pará-la. Era a hora dela. Hora dela sair dali de fininho, por que mais nada importava. Mas a verdade é simples: não adianta ter lugar para sentar quando se está no ônibus errado.

quinta-feira, 13 de setembro de 2012

Dramaticismo

A névoa de estresse
se condensa nos meus olhos enquanto
o grito de dor dilacera o meu peito
e repousa nas minhas têmporas.

O arco do olhos
aberto no tempo dos batimentos
e a mente que procura no arquivo da vida
a única coisa que substitui lágrimas
por dentes e sorriso:
sua imagem.







domingo, 2 de setembro de 2012

Predador

(Nervosismo se apodera do meu corpo. Suor escorrendo pela pele já umida, gota por gota. Coração palpita forte, quase que perceptível através da blusa. Passo acelerado, baque-baque do sapato na Pedra Portuguesa. Olhar periférico: ele continua lá, merda. Duas lágrimas caem dos olhos. Não. Não adianta chorar, mostre-se forte. Mordo os lábios prendendo o grito. A bolsa, o celular, a ligação. Mais rápido. Menos rápido, não pode correr. Viro a esquina. Olhar para a traseira: ele está ainda mais perto. E agora? Não desista, ainda pode dar certo. Cubra o pescoço, o cheiro pode atiçar alguma lembrança. Respire pelo nariz, não fique ofegante. Vamos!) Engulo o copo de uísque inteiro. De jeito nenhum vou permitir que o passado chegue até mim de novo.

Você

O meu tempo
é o mesmo que o teu, meu amor
Pois quando estamos juntos o mundo não nos acompanha
Tudo se esfuma,
Parecendo-se a teu rosto e nossas lembranças.

Sempre foi sobre você:
teus braços, pescoço e teus olhos
que antes de percorrerem meu coração
Percorreram meu pensamento...
e teu cheiro, ai, seu cheiro
entorpece meus sentidos
trazendo-me de volta para casa.

E se a escuridão se impor sobre nós
quero sentir teu corpo no meu
tua dor na minha
tuas lágrimas lavando-me os olhos cegos
e teu abraço afogando-me
para dentro de um rio
só nosso.

O destino está sujeito
às tuas palavras,
a teu semblante banhado numa áurea
o mesmo que reservou-me um caminho
sinuoso, porém direto
que me conduz para o que realmente importa:
você.
Ou felicidade, como prefirir.

quinta-feira, 9 de agosto de 2012

Fotografia

Em meio à registros fotográficos, ele começou a chorar. Ele segurou nas mãos trêmulas aquela foto em preto e branco e acabou por molhá-la com a água doce das ácidas lágrimas. De tempo em tempo, quando achava que seu coração estava morrendo, e morrendo de verdade, levava a fotografia ao peito. Trazia a imagem pra perto de si, tentando assimilá-la, trazê-la à vida. Olhava seus pés sem firmeza pregados ao chão e seus mocassins azul marinho surrados, que o faziam lembrar tanto da época em que voava e estes nunca tocavam o solo. Sentiu o frio acalmando-lhe as células do corpo, uma por uma. Assim, o arrepio lhe veio, deixando a dor de uma saudades sem fim. Quem o visse, diria que estava sofrendo por amor. Talvez estivesse, mas nada mais importava. Levou uma mão aos cabelos desgrenhados e negros enquanto com a outra, segurava um pedaço de papel desenhado. Segurava com tanta força que parecia que assim que o soltásse, este voaria até mundos nunca explorados. Estava tão só. Estava com ele mesmo e memórias de um passado tão eternamente acabável. Sua respiração agitada sentia o cheiro de rosas murchas e seus lábios estavam parcialmente separados e tentados a gritar. Gritar e nunca mais parar. "Te amo" - sussurrou num tom nunca ouvido por seres humanos, e na esperança de que alguém ainda pudesse ouví-lo. Levou um líquido parecido ao néctar até seus lábios e sentiu na garganta o formigamento. O formigamento de uma morte sem dor. Sem ela, a vida não valia à pena. Sem amar, não valia à pena. Sem certezas de algo tão incerto, não valia mais. Seus joelhos cederam ao peso de seu corpo, e adormecido em seus encantos, sua mão abriu e a fotografia voou. Voou até seu peito. Na tentativa de reverter a morte. Trazer de novo a vida.

Coisa de criança


Ela abriu os olhos entorpecida com a gritaria e assustada com o calor que queimava sua pele. Segurou o coelhinho pelas orelhas, bem forte. O coelhinho amarelo com rosa que ganhara no Natal. Com passos furtivos desceu da cama e foi ver o que estava acontecendo. Segurando o boneco em uma das mãozinhas delicadas, com a outra empurrou a porta de madeira sem se arriscar em espiar através da fechadura. A porta deslizou vagarosamente e ela se sentiu meio tonta, ou pela força que fez, já que a porta era dez ou vinte vezes maior que ela, ou mesmo pelo suor que cobria todo seu corpo. Colocou o rostinho medroso na fresta que preparara e viu sua mãe envolvida em berros e gestos agressivos. E o pai do outro lado gesticulando ‘’não’’ com a cabeça – a mesma que adquirira um tom vermelho tomate. Ela sentou ali e deixou as lágrimas escaparem dos olhos, bem devagar. Colocou a orelhas do bichinho na boca para não soluçar, para continuar sendo um fantasma espectador. Estava mais molhada que antes e um cheiro ardia no nariz dela. Era o cheiro da vergonha e do medo.  A mãe gritava, parecendo psicótica. O pai ria ironicamente. Ela não pôde deixar de pensar que mesmo ali, sentada no chão e chorando suas mágoas no bichinho infantil, ela era mais madura do que os participantes daquela cena grotesca que observava. Obviamente era muito pequena para entender o motivo das brigas ou até mesmo o que era uma briga de verdade. A maior briga em que já se envolvera estava relacionada com bolinhos de chocolate.  Ela levantou devagar, determinada a sair do espetáculo e voltar para cama. Segurou a maçaneta quando, de repente, o coelho, molhado de cima a baixo, escorregou de sua mão. A única parte dura tinha que encontrar o chão, claro. Quando o olhinho negro daquele coelho fez um pequeno baque contra as tábuas de madeira, a gritaria cessou. Ela ficou de olhos apertadinhos e fechados, esperando que começassem a gritar com ela também. Mas de tanto que olhavam para ela, ela mesma quase virou um olhinho individual e pequenino. Ninguém perguntou nada, ninguém pediu desculpas, mas também não havia motivo para isso. O pai e a mãe a pegaram carinhosamente e enquanto o pai acariciava as costas dela a mãe cantarolava bem baixinho. O casal, junto, levou-a até o banheiro, limparam-na – seu rosto, as mãos, as perninhas. O pai a pegou no colo, deu-lhe um beijo na testa e a mãe apoiava a mão no ombro do pai enquanto massageava seu pés. Deitaram-na na cama deles, aquele mar enorme de algodão. Ela fechou os olhos. E dormiu. Acordou abruptamente com a gritaria. Discutiam sobre qual sabão usar para lavar os lençóis molhados de xixi.

Uma homenagem.

Na nossa vida a gente conhece muitas pessoas, algumas ficam na memória e outras não. Das que ficam, existem aquelas que a gente sempre está relembrando e revivendo e existem aquelas que guardam-se carinhosamente num estoque quentinho ou num cantinho da cabeça. Assombra-me, ou talvez assombrar seja um verbo sinistro demais para utilizar e seja melhor dizer "surpeende-me", o impacto que um encontro pode ter nas nossas vidas. Vivemos numa realidade um pouco diferente da dos filmes de ficção ou romance. Vivemos num mundo construído sobre pilares de vulnerabilidade. E sou uma pessoa extremamente vulnerável quando se trata de saudades. Sinto saudades de cada pessoa que marcou minha vida, seja por um dia ou por alguns anos. Conheci um homem que a cada vez que o ouvia falar sentia uma alegria, um prazer pela vida. Um homem que conseguiu, mesmo que de longe, me proporcionar diferentes emoções (das quais nem sempre gostava, talvez por não conhecê-las) e que se fazia presente nas recordações. E era, e ainda é, difícil associar o passado cruel que algum dia ele já vivera com aquele simpático sorriso por detrás de seus belos olhos. Não é dramático a gente chorar por alguém, é um meio de permitir que as saudades se materializem e mais que isso, é um jeito, talvez não o único, de demonstrar a nossa dor. Esse mesmo homem será sempre lembrado do jeito que o conheci, engraçado, ativo e de bom humor. Será lembrado por suas belas palavras, ainda presentes entre nós, pairando no topo do Pão-de-Açúcar e por entre o bater de asas de uma gaivota.  Será lembrado como um homem forte. Um homem que se fez forte nas palavras que hoje emprego nas minhas poesias, se fez forte naquela única viagem e mais que isso, se fez forte nos nossos corações.

Tua presença é infinita
no mundo que hoje se deita sobre nós
e cobre-nos o corpo como um cobertor quente
de saudades e amor.

Tua presença é o som da tua risada
são tuas imortais ideias
tuas imortais batalhas.

Tua presença é o agradecimento
que paira dentro de meu peito
é a sorte de termos recebido alguém como ti
dos céus, ou da terra, ou da música.

Tua presença é e ainda estará
sobre nossos batimentos,
sobre nossos olhos e lágrimas
e sobre nossas memórias,
que assim como ti, nunca se apagam,
apenas crescem mais e mais
sem limite ou tempo suficiente
para torná-las passado.

segunda-feira, 30 de julho de 2012

Será que faz sentido?


Já foste os três:
O meu –melhor- amigo.
Enquanto a língua batia
E os braços arfavam,
Os sonhos da criança eram os mesmos
-- E outros
Mas eram todos nossos.

Já foste os dois:
O meu- amigo.
Enquanto a carapaça de preconceitos
E a existência de problemas
Atingia-nos num degradê quase comum de sentimentos
O bater do coração acalmava os sentidos
Aqui dentro.

Já foste um:
O meu.
Enquanto sonhava alto lá daquela montanha
Éramos um só
Pois numa dança da língua já se falava
O seu sorriso apimentado,
Seu pé e sua cabeça.
Saudades.
Será que um dia a gente recomeça?

Árvore Amarela

Duas palavras martelando a mente, e três o coração. O sentimento virou recalque. Naquela árvore da qual brotavam as mais belas flores ficaram as folhas amareladas da dor sem fim, meu querido. Para minimizar o entorpecido sentido, talho com o maior cuidado desenhos de flores em cada uma das folhas. Mas não é eficiente tampar uma cena com um vidro transparente. A vida do artista é dura, não pelo personagem em si, mas por ter a capacidade de sentir tudo mais intensamente. E somos todos potencialmente artistas, alguns exploram sua arte e outras a negam. Então é como dizer que a vida é dura pela sua intensidade. É dura por que hoje não sabemos o que iremos sentir no fim do dia e nem sabemos se amanhã de fato será um novo dia ou se será o mesmo, mas com luz diferente. E como um castelo de cartas, frágil, colocam-se na base as incertezas, sujeitando a vida a um leve sopro. O tempo vai passando e os parênteses se fecham e abrem: o rosto se adapta para escoar as lágrimas, o castelo cai e se reconstrói, mas a árvore continua sempre igual. Só que o amarelo te parece cada vez mais simpático, não é?

Trans




"elemento de formação de palavras que exprime a ideia de além de, para além de
                                              Infopedia - dicionário de Língua Portuguesa "



Durante toda a nossa vida a gente costuma ouvir algumas coisas de maneira repetitiva: "No fim tudo vai dar certo", "Na hora você simplesmente vai saber", "Relaxa que vai ficar tudo bem", "No futuro você vai ver que as coisas não foram tão graves quanto você achou na época em que as vivia" e assim por diante. Mas eu acredito que nada disso serve, pelo menos nunca serviu para mim. De que me adianta saber que tudo vai ficar bem se eu não to bem agora? E de que adianta saber que no futuro eu vou olhar para tudo isso de forma diferente? Eu to vivendo AGORA.
A questão é essa, eu to vivendo agora. E tenho o direito de sofrer, de rir e de chorar de emoção e de sentir saudades. Tenho o direito de amar e querer ser amada, e tenho o direito de querer sair abraçando meus amigos quando estou triste e confusa. A gente tem que transviver. Um verbo que particularmente eu pretendo passar a utilizar bastante. Quer dizer viver além de, através de, para trás de. Ouvir o batimento do coração e transformá-lo num beijo ou abraço ou numa atitude um quanto imprudente. Por que vida a gente só tem uma, pelo menos da qual a gente lembra. 
E o amor? O amor é quase sinônimo de transviver. É você se sentir imbatível só de estar com alguém especial, ou com amigos ou até com sua família (seja numa festa ou num jantar de domingo). É você saber que o que acontece na sua cabecinha que te faz sofrer pode acabar num piscar de olhos, basta amar. É ir além de frases piegas e clichés ridículos por que você sabe que no final o que vale de verdade é o tum-tum acelerado dentro do seu peito, debaixo da carne e ossos. 
Viver sem medo é impossível, mas a gente tem que tentar ultrapassá-lo. A gente não pode deixar ele amarrar a gente a um sentimento recalcado, ou a um arrependimento, ou até a um tempo que não vai voltar. A vida é curta demais para gente se travar com o medo. A gente tem que se arriscar e tem que ser jovem mesmo sendo velho. A gente tem que ter tempo para gente e para todo mundo que a gente ama. A gente tem que viver o AGORA. O futuro ninguém sabe. A vida é curta demais para a gente se dar o direito de ser infeliz. Não to falando de ESTAR infeliz, mas sim de assumir uma identidade de infelicidade. Isso só vale a pena se a gente não ama ninguém ou alguma coisa.
Os tempos da infância eram sim mais simples, os cadernos eram para desenhos de cavalos verdes e os amores não passavam de briguinhas que duravam 3 minutos. Mas e quando a gente amadurece? Será que é de todo ruim? É ruim por que na hora do aperto a gente só pensa no lado ruim de ser mais velho. A gente esquece que também tem lado bom: tem a experiência, tem os amigos que a gente fica cada vez mais próximo, tem as paixões, as viagens, as palavras e muito mais. Agora a gente tem novas ferramentas, tem como transformar o amor em sexo, tem como confiar e dar confiança, tem como se arriscar em novas aventuras (muitas vezes proíbidas), tem como recomeçar e saber (ou não) o que a gente tá fazendo.
A gente tem que aprender a ir além do que nos permeia, ir além do costume e da rotina. A gente tem que transviver, tem que renovar e tem que ser. Nunca deixar de ser quem a gente é: um combo de coisas boas e detestáveis. Nunca deixar de amar, seja a nós mesmos ou a qualquer outra coisa. Afinal, de que vale a vida sem amores?

quarta-feira, 18 de julho de 2012

Peça

As cortinas se abriram,
palmas entraram
maquiagem e figurino
lindo cenário
faces belas...
Mas de que adianta
se a peça está mal ensaiada?
A garvata solta
sufoca e fere a garganta
Os lábios desenquadrados
de batom vermelho
no corpo nu
na testa
e na pele.

As roupas invisíveis
recobrindo a chuva
e recíprocamente
molhadas.

Dois sexos em um.

Pessimismo?

Onde dormem os inocentes
cambaleantes no trapézio do mundo
com rede invisível, furada,
cegados pelos sonhos que são
produtos do bastão do otimismo?

Onde repousam as cabeças
vazias de vontade e ação
que alimentam utópicamente
o dragão carnívoro do sistema
com vegetais crus?

Onde descansam as armas
e a pólvora amarga
de preconceito
que move a máquina destruidora do mundo?

Onde estamos realmente
se não na esfera incandescente
povoada por inúteis e alguns egoístas
destruidores do que ainda resta?

sexta-feira, 13 de julho de 2012

Eufemismo

E ainda derramo minhas lágrimas por ti,
e dói o peito
sem jeito
que se torce e contorce
em uma palavra:
saudades.

Entalpia


Você entra na sala disposto a deixar o relógio do lado de fora, mas o mau humor acumulado no dia ainda repousa nas suas têmporas arqueando levemente suas sobrancelhas.  Sentado no seu tapete você delimita seu espaço, ciente e sedento por explorá-lo com todo seu corpo - esticando, dobrando, sentindo.  Durante aquele momento você tenta se desapegar do material, do corpo, das dores. Sentindo aquele calor - que no momento é só calor, mas depois você percebe que é energia dissipada - você tenta se esquecer da dor dos seus músculos e do fiozinho de cabelo que dança na sua pele suada da nuca.  E a cada movimento um pequeno pedaço do seu corpo se transparenta, transparecendo cada vez um pedacinho maior de alma. Ninguém te olha, ninguém te julga, inclusive você mesmo passa a se aceitar. O mundo lá fora continua e você nem se dá conta de que ele existe.  Aquele momento é seu e só seu, você percebe. Sua mente escapa do seu corpo pairando sobre algum problema, sobre situações cotidianas, mas cabe a você trazê-la de volta àquela paz que você mesmo esta a construir. Mas a dor no abdômen, os braços espasmáticos e o suor são obstáculos difíceis, nunca te impedindo de tentar esquecê-los. Ou abraça-los. Você deita no próprio eixo embalado por endorfina, ar, música, chuva. Seus músculos faciais repousam na sua pele pálida e contorcem-se em canais para drenar as lágrimas. E as lágrimas coreografam o sentimento, que não se pode pensar apena sente-se.  O esboço de um sorriso aparece e o calor vai sumindo, permanecendo apenas o conforto da própria sensação e o arrepio do perdão. Você se perdoa, se aceita e recebe de você pra você mesmo aquela energia presa. A mente larga a chave da energia crescente que agora como uma áurea banha teu corpo. E aí você percebe que o que cai dos seus olhos não são lágrimas. São pedaço de alma que agora notam que o importante é o presente, não o que foi e nem o que virá. 

Antropofagia



Quem trouxe a fome
Que corrói a pele e carcome
Os insaciáveis lábios?

Quem espalhou a solidão
Tão só quanto a dor
Que leva almas inocentes?

Quem decidiu que os vermes são as células de uns e não de outros?

Quem definiu que o capital
Vale mais ou tanto
Quanto o corpo?

Quem disse que se pode explorar
Por causas injustas
E lucrar em cima de sangue?

Quem criou o ódio se não o próprio homem?

Somos poucos os que restam
Que usam lentes para ver a realidade,
Que não escondem os sentimentos e que não aceitam a eloquente desonestidade.

Somos poucos, restam poucos
Que enxergam o sangue dos bancos, das bombas e dos canais do mundo
Que nada mais são do que a dor que transpassa a vida recheada de vagabundos.

Somos poucos, restam nada
Que estamos moribundos
Que somos as verdadeiras estrelas do planetário do mundo
Que se torna uma cúpula de plantas contendo carnívoros.
Assim surge o canibalismo:
A única razão da humanidade. 

Bem-vindo

A poesia não reside nas palavras... Reside nos fatos, no mate, na praia, no medo, no tempo, na dor, na alegria, na tristeza, nas paisagens, na música, na cultura, nas estrelas... Mas por falta de recursos, transformo-a em palavras.